'Desequilíbrios financeiros' têm, segundo a Secretaria Estadual de Tributação, impedido o Rio Grande do Norte de regulamentar uma lei que beneficia diretamente o contribuinte. O governo do estado sancionou há exatamente um ano, e tenta regulamentar desde então, a Poupança Fiscal, lei que, a exemplo da Nota Fiscal Paulista, devolve até 30% do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) pago pelo contribuinte. Em São Paulo, o valor devolvido pode ser sacado direto na conta ou usado para abater outros impostos.
As regras no RN ainda não estão claras. Só com a regulamentação é que o contribuinte potiguar vai saber quanto será devolvido, em quanto tempo o crédito poderá ser resgatado, e onde poderá ser aplicado. Em São Paulo, local onde o deputado estadual Walter Alves, autor do projeto de lei, esteve antes de apresentar o projeto, basta o contribuinte informar uma conta bancária no site do programa para resgatar o dinheiro.
Lá também é possível usar o valor para abater ou quitar o IPVA, desde que o veículo esteja no nome do participante do programa. Para pedir o resgate, basta informar o CPF ou CNPJ e a senha cadastrada e solicitar a opção desejada. O valor é creditado na conta uma semana após o pedido e fica à disposição do contribuinte por até cinco anos. O potiguar Cleanto Roberto, 56 anos, gostou da ideia. O professor não costuma pedir nota fiscal em todos os estabelecimentos comerciais, mas admite que mudaria de hábito se houvesse algum tipo de compensação financeira.
A questão é que por aqui a lei ainda deve demorar a entrar em vigor. O governo do Estado sancionou a lei há um ano e ainda não sabe quando realmente a regulamentará. "A lei propõe que até 30% do imposto seja devolvido ao contribuinte. É um percentual muito alto. O que ocorre é que o governo, em função dos desequilíbrios financeiros, não pôde regulamentar a lei até agora", afirma José Aírton, secretário estadual de Tributação.
Aírton explica que 'qualquer coisa que gere receita será deixada para um segundo momento' e admite que a Secretaria já pensa em reduzir o percentual que será devolvido ao contribuinte no estado.
Antes de apresentar o projeto, deputado Walter Alves foi a São Paulo conferir experiência fiscal
Embora o autor da lei, deputado Walter Alves, acredite que haverá ganho de arrecadação - os contribuintes passarão a exigir nota fiscal, a sonegação vai cair, e o estado arrecadará mais - José Aírton não tem muita certeza do impacto da nova lei. "Com a sonegação do jeito que está, não tenho certeza nenhuma do impacto. Também não se sabe quanto a Poupança Fiscal vai gerar de despesa", afirma o secretário. Cálculos estão sendo feitos para se chegar ao real impacto da regulamentação.
O imposto - embutido nos preços - deixa de pertencer ao contribuinte, e passa a ser 'propriedade' do Estado no instante em que o contribuinte paga pelo produto ou serviço, num estabelecimento legalizado. Devolvê-lo, mesmo que parcialmente, explica José Aírton, seria abrir mão de parte da receita do Estado, que tem no ICMS uma de suas principais fontes de arrecadação. "Não podemos abrir mão de nenhuma receita neste momento", afirma José Aírton, secretário de Tributação, que recebeu a missão de regulamentar a lei no estado.
Em São Paulo, o número de contribuintes cadastrados já ultrapassa os 14,1 milhões - quatro vezes a população do RN - e o total distribuído entre os contribuintes já chega aos R$ 6,9 bilhões, segundo dados da Secretaria da Fazenda de São Paulo. A lei que criou a Nota Fiscal Paulista foi regulamentada há quase seis anos.
Dirigentes lojistas do RN cobram mais transparência
O presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do RN (FCDL-RN), Marcelo Rosado, cobra mais transparência do governo federal, estadual e municipal quanto a aplicação dos tributos. "O governo exige um alto nível de eficiência do empresariado, coisa de primeiro mundo. Por outro lado, não se vê eficiência por parte do governo, na gestão de recursos que ele arrecada".
Estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) e divulgado ainda em 2011 mostrava que o Brasil era o país que proporciona o pior retorno dos valores arrecadados em bem-estar para seus cidadãos, entre os 30 países com as maiores cargas tributárias. Para chegar ao ranking, o instituto utilizou dois critérios: a carga fiscal em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) e o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).
Na época da divulgação do estudo, o presidente do IBPT, João Eloi Olenike, explicou que o Brasil ficava em último porque tinha carga tributária elevada e IDH baixo. O professor Cleanto Roberto, 56, chega a se irritar quando pensa na carga tributária do país. "Pagamos altos impostos e não vemos melhorias na educação, na saúde. A saúde está um caos e o estado está repleto de obras inacabadas", reclamou. Cleanto até já decidiu o que vai fazer com o crédito que terá direito, dentro do Poupança Fiscal. "Vou investir na saúde e educação dos meninos".
O valor arrecadado pelo Estado por meio dos impostos deveria ser revertido para o bem comum, para investimentos e custeio de bens públicos, como saúde, educação ou segurança pública. "No entanto, na prática, como o imposto não está vinculado ao destino das verbas, ao contrário de taxas e contribuições, pagá-lo não dá garantia de retorno", diz artigo, sem assinatura, publicado no portal Finanças Práticas.
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