Dnocs se comprometeu judicialmente a corrigir a ocupação em torno do açude, mas ainda não retirou do local balneários que põem em risco a água consumida em Caicó
O Ministério Público Federal (MPF) em Caicó vem cobrando da Justiça o cumprimento do acordo firmado pelo Departamento Nacional de Obras contra a Seca (Dnocs) e que prevê a proteção da Área de Preservação Permanente (APP) em torno do açude Itans, de modo a impedir prejuízos à água que abastece Caicó. Dentre as medidas prometidas pelo Dnocs está a desocupação e demolição dos balneários, que legalmente não podem funcionar em uma APP.
O acordo judicial foi firmado em setembro de 2013, já transitou em julgado e, mesmo passados 20 meses, o Dnocs segue sem adotar algumas das ações previstas. A demora coloca em risco o açude, cuja principal função é o abastecimento humano na cidade de Caicó. O Ministério Público Federal peticionou à Justiça este mês, dentro da ação civil pública 0000200-88.2013.4.05.8402, para que declare o não cumprimento do acordo e estipule prazo de 90 dias para o departamento tomar as medidas necessárias à proteção da área.
Agricultores - Um laudo produzido por técnicos da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão (CCR) do MPF apontou que não há viabilidade jurídica e técnica para manutenção das edificações e atividades dos balneários na área de APP do Itans. O procurador da República Bruno Lamenha vem acompanhando o processo e ressalta que, ao contrário dos balneários, o laudo apontou a possibilidade de manutenção dos pequenos produtores rurais que plantam ou criam animais na área de preservação permanente.
Para que esses pequenos produtores rurais permaneçam, contudo, é necessário um planejamento a ser coordenado pelo próprio Dnocs, além do devido licenciamento ambiental. A última manifestação do MPF à Justiça requer que o departamento se manifeste sobre o interesse em coordenar a elaboração de um Plano Ambiental de Conservação e Uso do Entorno de Reservatório Artificial (Pacuera), para disciplinar a ocupação e as atividades permitidas aos pequenos agropecuaristas.
São sugeridas ações como a implantação de sistema de tratamento de esgotos domésticos; tratamento e destinação final dos resíduos sólidos; utilização de técnicas de preparo do solo para não provocar a impermeabilização; entre outras.
Riscos - O laudo dos técnicos do MPF destaca que um dos principais impactos ambientais ao açude decorrem da impermeabilização do solo por parte dos balneários, o que impede o crescimento da vegetação natural. “Além disso, há impactos indiretos, como o aumento do escoamento superficial e, consequentemente, da erosão do solo, gerando assoreamento e reduzindo a qualidade da água do reservatório”, aponta.
As áreas de apoio dos balneários (acessos e estacionamentos) também impedem a regeneração da vegetação, tanto pelo pisoteio dos pedestres, quanto pelo movimento de veículos. Os técnicos confirmaram que a presença de vegetação natural na APP do açude Itans é uma condição extremamente necessária para a prevenção e redução do assoreamento do reservatório, assim como para melhoria da qualidade da água.
Os técnicos da 4ª CCR destacaram que atividades como as dos clubes e balneários, mesmo que estabelecidas medidas para minimizar danos ou ainda tentativas de compensação ambiental, representam forte impacto negativo ao ambiente e proporcionam uma difícil conciliação com o objetivo do reservatório, que é o abastecimento da população. Um desses impactos diz respeito ao considerável aporte de efluentes líquidos e sólidos despejados no Itans.
A posição do Ministério Público Federal é clara: “O MPF não desconhece que Caicó carece de espaços de lazer para a população e que os balneários, durante anos, foram referência nesse sentido para a sociedade local. No entanto, esse dado histórico não se converte numa panaceia para legitimar a manutenção de intervenções significativamente nocivas (e vedadas pela legislação) em área de preservação permanente.”
O procurador Bruno Lamenha lembra que “nada impede que outras opções de lazer se desenvolvam ou ainda que os próprios balneários possam operar em locais fora da área de preservação permanente do açude Itans, desde que seja observada a legislação ambiental, especialmente o devido licenciamento”. Nenhum dos empreendimentos hoje existentes possui licença ambiental.
Como reflexo disso, pontos de erosão nas imediações dos balneários já vêm sendo observados, embora não sejam as únicas formas de agressão ao reservatório: “Não resta dúvida que as ocupações das margens, incluindo os balneários, que concentram uma grande quantidade de pessoas, são fontes de degradação da qualidade da água, por esgotos domésticos e resíduos”, acrescenta o laudo.
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